Alguns trechos dos discursos de posse do presidente Lula e do governador paulista José Serra, proferidos ontem, parecem ter sido extraídos de um debate ao vivo entre os dois, em especial no que se refere à política econômica e à trégua entre situação e oposição para ajudar na governabilidade do país.
Sobre a política econômica, perguntou Lula, em seu costumeiro auto-elogio: "Em que momento de nossa história tivemos uma conjugação tão favorável e auspiciosa de inflação baixa, crescimento das exportações, expansão do mercado interno com aumento do consumo popular e do crédito, e ampliação do emprego e da renda dos trabalhadores?"
Vejamos o que disse Serra, na cerimônia de transmissão do cargo no Palácio dos Bandeirantes: "A política da pasmaceira em relação à nossa economia tem consagrado a mais perversa tendência depois de um século de prosperidade: a semiestagnação, que já se prolonga por 25 anos. Antes de ontem, ela poderia ser explicada pela superinflação devastadora; ontem, pela terapia antiinflacionária e conjunturas externas turbulentas; hoje, quando o Brasil é praticamente o último da América Latina e dos emergentes, e o céu da economia internacional é de brigadeiro de seis estrelas, os resultados ruins não são colhidos da árvore da vida, da fatalidade, mas da fragilidade da política macroeconômica, hostil à produção e aos investimentos."
Disse mais Serra, em outro trecho do discurso: "(...) o vertiginoso aumento das remessas de lucros das empresas estrangeiras aqui instaladas e dos investimentos de empresas nacionais no exterior, recursos que se vão a fim de criar empregos lá fora, mostra que não falta poupança ao Brasil para aumentar sua capacidade produtiva e seus empregos – o que falta são oportunidades lucrativas de investimento, espantadas pela pior combinação de juros e câmbio do mundo, em meio a uma carga tributária sufocante". O governador paulista mostra-se aqui um atento leitor de jornais. A grande mídia noticiou mas não deu o devido destaque, nos últimos dias do ano passado, que pela primeira vez na história os investimentos das empresas brasileiras no exterior superaram, em 2006, os trazidos pelos estrangeiros para cá. Para um país tão carente de capitais, trata-se de uma tragédia. E o governo do presidente Lula fez que não viu nem ouviu.
Sobre a trégua para a governabilidade, afirmou Lula, dirigindo-se à oposição: "Quero pedir-lhes, apenas, que olhemos mais para o que nos une do que para o que nos separa. Que concentremos o debate nos grandes desafios colocados para o nosso país e para o mundo. Que estejamos à altura do que necessita e deseja o nosso povo". Belo discurso, mas esvaziado pela conduta pregressa. O PT na oposição sempre apostou no quanto pior, melhor, torpedeando iniciativas do governo Fernando Henrique a torto e a direito, sem levar em conta se eram boas para o país.
Eis a digna resposta, mesmo involuntária, de Serra: "Não fomos, não somos nem seremos adeptos do quanto pior, melhor. Seremos oposição no plano federal justamente porque não somos iguais. Diante de cada projeto de lei ou de emenda constitucional, saberemos separar o que beneficia o país do que o atrasa; os interesses do governo dos interesses do estado; as conveniências de um partido dos anseios da nação. Em suma: não esperem de mim o adesismo que não se respeita nem a agressão que não oferece respeito". E mais, logo adiante: "Quem é altivo na derrota não se sujeita. Quem é humilde na vitória não exige sujeição. É assim que se faz uma República."
Recado mais claro, impossível.
terça-feira, 2 de janeiro de 2007
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