quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

Pega ladrão

Em boa hora o Supremo Tribunal Federal decidiu que é ilegal o aumento de 90,7% que os deputados e senadores se concederam, em nome da isonomia em relação aos salários do próprio STF. Tratava-se, de fato, de uma imoralidade, não apenas porque os parlamentares transformaram em piso o que é teto dos vencimentos de servidores públicos mas também porque já recebem uma série de regalias como 15 salários por ano, ajudas de custo para gastos com combustível e estadia, auxílio-moradia (no caso de não ocuparem apartamentos funcionais), verba para despesas de gabinete, inclusive pagamentos de funcionários, e ainda passagens aéreas ida-e-volta, entre Brasília e o estado de origem, a cada fim de semana. Tudo somado, dá mais de 100 000 reais por mês, valor que transforma os deputados e senadores brasileiros nos parlamentares mais bem pagos do planeta, segundo observou o jornal espanhol El Pais. Como se fosse pouco, eles ainda têm direito a uma régia aposentadoria depois de apenas oito anos de contribuição ao sistema de previdência do Congresso, enquanto os trabalhadores do setor privado, que se aposentam com uma fração do que recebem no contra-cheque, precisam contribuir para o INSS durante 35 anos.
Esse verdadeiro assalto aos cofres públicos foi perpetrado pelas mesas diretoras do Senado e da Câmara, com a concordância dos líderes partidários. Os presidentes das duas casas do Congresso, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), ambos em campanha para a reeleição aos atuais cargos, não pestanejaram em fazer caridade com o chapéu alheio, ou seja, dos contribuintes, para anabolizar as respectivas candidaturas. E assim como agem os gatunos em geral, com discrição e na calada da noite para não chamar a atenção da polícia, escolheram para o gesto magnânimo a época natalina, em que o Congresso vive praticamente às moscas. Não contavam, decerto, com a reação popular subseqüente, respaldada por entidades como a OAB e a CNBB. Em Brasília, ontem, houve também protestos de sindicalistas e estudantes.
A decisão do Supremo foi tomada no julgamento de mandado de segurança impetrado pelos deputados Carlos Sampaio (PSDB-SP), Fernando Gabeira (PV-RJ) e Raul Jungmann (PPS-PE), que questionaram a validade de um reajuste salarial concedido por medida administrativa, sem passar pelo plenário e com base num decreto legislativo caduco. Agora, segundo se noticia, o Congresso tende a aprovar um aumento mais moderado, de 28,4%, equivalente à inflação ocorrida no país desde 2003, ano do último reajuste salarial dos parlamentares. Com esse percentual, em vez dos 24 500 reais aprovados por Renan e Rebelo há menos de uma semana, para vigorar na próxima legislatura, o salário nominal iria para 16 500 reais. Ainda é muito, porque são quase 600 os senadores e deputados federais brasileiros e também porque essa gente só freqüenta o local de trabalho três dias por semana.

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