Se há algo insuportavelmente provinciano e atrasado em política, esse algo é com certeza o comportamento vil de políticos, militantes e simpatizantes que agem como se a vitória nas urnas lhes desse um salvo-conduto para pisar em adversários, declarados ou supostos. Não se trata apenas de fazer declarações sem um mínimo de comedimento. Estas, até se perdoam como produtos do calor da hora. Mas trata-se também, o que é grave, de tentar intimidar as pessoas, com o uso do aparelho ou dos aparatos governamentais. Dois exemplos desse tipo de comportamento foram dados, um pelo governador reeleito do Paraná, Roberto Requião, na segunda-feira, e outro por um delegado da Polícia Federal, ontem à tarde. E as vítimas, em ambos os casos, foram jornalistas.
Requião transformou uma entrevista coletiva em exibição mesquinha de revanchismo. Apoiado por uma claque de políticos e militantes, que vaiavam os jornalistas por perguntas por eles consideradas impertinentes, o governador peemedebista atacou parte da imprensa de seu estado, incluindo alguns jornalistas citados nominalmente por ele, pelo fato de ter quase perdido a eleição para o adversário, Osmar Dias, do PDT. Depois de algumas respostas irônicas ou de ignorar as perguntas formuladas, encerrou de modo abrupto e grosseiro a coletiva, quando a repórter Mari Tortato, da Folha de S. Paulo, lhe dirigia uma segunda indagação. De acordo com o site Comunique-se, interrompeu-a dizendo que ela já falara. E, ao ouvir da repórter que estava autorizada pela assessoria do governador, respondeu que então 'desautorizava' a permissão dada, acabando em seguida com a coletiva.
O delegado da Polícia Federal, de nome Moysés Eduardo Ferreira, agiu ainda pior em relação a jornalistas da revista Veja. Cinco deles foram intimados pela PF a depor, a pretexto de prestar esclarecimentos sobre uma reportagem publicada na semana retrasada, sob o título Operação Abafa, e três – Júlia Duailibi, Camila Pereira e Marcelo Carneiro - compareceram às dependências da força em São Paulo, na tarde de ontem. Para surpresa deles, o delegado os inquiriu como se fossem acusados, e não testemunhas. No melhor estilo DOI-Codi, praticado nas masmorras da ditadura, o delegado pressionou os jornalistas a revelar suas fontes, quis saber da orientação política do editor responsável pela reportagem, lançou mão de ameaças e ainda tentou distorcer declarações dadas ao ditar o texto para o escrivão, no que foi impedido pela representante do Ministério Público presente, Elizabeth Kobayashi. Por exemplo, segundo o site da revista, depois de indagar a Júlia Duailibi os motivos de ela ter escrito 'essa falácia' e de ouvir como resposta um questionamento sobre o sentido do depoimento, uma vez que ele já chegara a tal conclusão antecipada, Ferreira quis atribuir à repórter o termo que ele empregara, no depoimento ditado.
Como se não bastasse, ainda manteve retido durante horas o repórter Marcelo Carneiro, a ponto de a direção da revista ter de pedir a ajuda do senador Tasso Jereissati, presidente do PSDB, para interceder junto ao ministro Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, a quem se subordina a PF, pela liberação do profissional.
Cabe a pergunta: onde estamos? Quando o representante de uma força policial federal exorbita de tal maneira de suas funções, agindo como um gorila censor e árbitro autonomeado da liberdade de imprensa, e o governo nada faz para coibir o abuso, somos obrigados a concluir que vivemos não numa democracia, mas numa republiqueta de bananas indigna de qualquer respeito.
quarta-feira, 1 de novembro de 2006
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