O incisivo comentário do jornalista Clóvis Rossi na página de opinião da Folha de S. Paulo de ontem merece ser lido não apenas pelos assinantes e compradores do jornal mas também por todos aqueles que ainda dão importância à ética na política. Ele se refere ao encontro de artistas com o presidente Lula na casa do ministro Gilberto Gil, da Cultura, havido na semana passada, no qual os atores Paulo Betti e José de Abreu, o cineasta Luiz Carlos Barreto e o músico Wagner Tiso fizeram perante a imprensa presente, sem nenhum pejo, o elogio da corrupção na política. Agora é o presidente em pessoa que assume, desmentindo-se a si próprio em relação a declarações passadas, ter recorrido ao joio, para não dizer escória, na construção da base de apoio parlamentar. Estará ele tão seguro da reeleição que mandou o recato às favas? Depois dessa farta demonstração de pouca vergonha, espantosa foi também a afirmação da filósofa (de botequim?) Marilena Chauí de que o governo Lula desenvolveu uma 'ação muito firme' contra a corrupção. Onde e quando isso aconteceu ninguém soube, ninguém viu, a não ser ela.
Abaixo, a íntegra do comentário de Rossi, publicado sob o título A consagração da merda:
"Pegou e fez escola a sociologia política da merda, exposta inicialmente pelo ator Paulo Betti para justificar a crise ética do governo Lula. Betti disse, curto e bem grosso: "Não dá para fazer [política] sem botar a mão na merda".
Uma semana depois, Lula repete, menos grosso, mas rigorosamente com o mesmo sentido: "Política a gente faz com o que a gente tem. Não com o que a gente quer". E, em seguida: "Maioria a gente constrói pelo que a gente tem ao nosso lado.
Não pelo que a gente pensa que tem. Esse é o jogo real da política que precisou ser feito em quatro anos para que chegássemos a uma situação altamente confortável".
Não é que seja novidade ou surpresa. Novidade é o fato de que quem se dizia monopolista da ética agora assume gostosamente a mais cínica versão do que é política.
De quebra, desconstrói as versões anteriores, a da "conspiração das elites" e a do "fui traído", que todo mundo sabia que eram ficções, mas que foram sustentadas ao longo de toda a crise. Não houve traição, confessa agora Lula. Houve "o jogo real da política que precisou ser feito". Leia-se: o mensalão (para não falar em outras atividades, tipo sanguessugas, que também envolvem figuras graúdas do lulo-petismo).
Compare-se o Lula de hoje com o Lula do seguinte trecho de seu discurso de posse: "O combate à corrupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão objetivos centrais e permanentes do meu governo. É preciso enfrentar com determinação e derrotar a verdadeira cultura da impunidade que prevalece em certos setores da vida brasileira".
Pronto, está demonstrado o estelionato eleitoral praticado em 2002. Vai-se repetir agora, ao que tudo indica, mas já não como estelionato. O eleitor está informado que o presidente botou a mão na merda. Mas não se importa."
quinta-feira, 31 de agosto de 2006
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